quinta-feira, julho 02, 2009

A atualidade do cinema nacional

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O cinema tupiniquim parecia morto há mais ou menos uma década, não tínhamos obras de expressão, a indústria se resumia a dramas aleatórios com atores globais e em nada lembrava a época dourada de produções autorais e criativas de figuras como Glauber Rocha. Nosso cinema vivia um ostracismo terrível e afastava muitas pessoas dos cinemas – se você reparar, inclusive, nos últimos anos vários cinemas faliram nas principais cidades brasileiras, posso exemplificar na minha cidade com o cinema que ficava ao lado da Catedral Metropolitana (acho que o nome dele era Rio Branco, desculpe a desinformação).

Mas onde quero chegar? Isso está mudando, e tem tudo para melhorar cada vez mais daqui para frente! O cinema como expressão artística está resgatando a qualidade dos roteiros e das atuações. Entenda como o cinema nacional consegue se reerguer mesmo em meio à 'crise de criatividade' hollywoodiana e porquê ele pode ser uma opção aos blockbusters repetitivos!

  • A reviravolta

Tropa de Elite

Por algum tempo nosso cinema ficou limitado a extensões de programas da Rede Globo com os mesmos atores, produtores e equipe técnica desta – apesar de ser uma empresa jornalística de grande porte ainda é muito pouco para nosso cinema. O cinema nacional mostrou que estava recuperando o fôlego com Central do Brasil (1998), que levou Fernanda Montenegro à indicação ao Oscar e ainda venceu o Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro, e com O Auto da Compadecida (2000) que, apesar de não ter tido o mesmo sucesso internacional e de ainda ser da safra de extensões da Globo, foi uma produção de altíssima qualidade.

Essas obras tornaram o cinema novamente viável e cobiçado pelos brasileiros, os patrocínios embora raros voltaram a surgir, novos nomes se destacaram e ainda tivemos a Medida Provisória 2.281 que, em 06 de Setembro de 2001, criou a ANCINE (Agência Nacional de Cinema), que tem a missão de fomentar a nossa produção cinematográfica.

A fase seguinte promoveu muitas obras com alta conceituação internacional, mas que mostravam um Brasil não totalmente fiel à realidade (ou pelo menos apenas uma face da realidade que permitia mais produções, mas que não representava nosso todo). Aí vieram obras como Cidade de Deus (2002), Tropa de Elite (2007) e Última Parada – 174 (2008) – todos filmes que mostram a violência e as favelas brasileiras. Evidentemente são realidades que devem ser transmitidas para nosso povo, para que não passem despercebidas e tenham a atenção que merecem, bem como devem ser repassadas para outros países para que eles conheçam um pouco sobre nós, sobre quem somos. Okay. Mas essa não é nossa única face, temos muito mais a mostrar, muita cultura, muito conhecimento. Podemos fazer mais.

  • A atualidade

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No estudo dos roteiros conhecemos os Plot Point, que já foi até um dos nomes que esse blog já teve, hehe. O que ele representa é o ponto de virada do roteiro, aquela ação que desencadeia uma reviravolta no filme, que pode ser o começo do seu final, por exemplo. Vejamos Titanic, o choque com um iceberg mudou o rumo da história, alterou a sequência lógica dos fatos que levaria a um final feliz dos mocinhos e começou o fim da história, a tragédia. Enfim, essa foi uma explicação rápida e superficial para entrar nesse ponto, onde um filme foi muito importante: Se eu fosse você (2006) foi o plot point para a fase contemporânea do nosso cinema.

Nessa película temos um roteiro baseado numa premissa relativamente simples, ou seja, não é um drama profundo de intrincadas correlações, eventos marcantes, com várias referências ou detalhes reveladores (como em Lost, por exemplo). Não. É uma produção que tem na sitcom e nas excelentes interpretações de Tony Ramos e Glória Pires o seu alicerce, algo quase teatral.

O novo gás que nosso cinema conseguiu deu maior tranquilidade para que esse estilo de obra fosse desenvolvida – trabalhos leves e para se assistir com a família, Se eu fosse você 2 (2009), por exemplo, levou 6 milhões de pessoas aos cinemas. O povo está voltando a se afeiçoar às nossas produções e outras obras estão seguindo esse modelo de premissa básica + grandes atuações.

  • Um nome

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Quem tem sido o grande nome desse nosso novo cinema, sem dúvidas, é Selton Mello. Ele estava presente num dos dois filmes que eu indiquei como aqueles que reergueram nosso cinema: O Alto da Compadecida. E depois disso, a lista é grande! Ele protagonizou a adaptação do seriado Caramuru (2001), protagonizou um filme que também teve grande importância para nosso cinema, Lisbela e o Prisioneiro (2003), importância essa devido ao fato de ter sido feito especialmente para o cinema em uma época que ainda sofria com as adaptações Globais, depois fez o fantástico Garotas do ABC (2004), O Coronel e o Lobisomem (2004) e o prestigiado Cheiro do Ralo (2005). Depois de uma pausa com as grandes produções ele voltou com filmes que refletem essa premissa da simplicidade aliada à boa atuação, Meu nome não é Johnny (2008), Feliz Natal (2008), Mulher Invisível (2009) e Jean Charles (2009). E se já não bastasse ele já está com duas produções finalizadas para este ano: Erva do Rato (2009) e Federal (2009), além de Reis e Ratos (2009), que foi produzido em apenas 17 dias e conta a história de um agente da CIA que vem para o Brasil e acaba gostando da vida boa e resolve ficar. Uma verdadeira Overdose de Selton Mello.

A importância desse nome para nosso cinema é singular, ele está puxando o bonde de grandes produções para atrair o público e criar um espaço mais confortável para que outros nomes menores surjam com tranquilidade. Ele inclusive se afastou um pouco dos seus trabalhos na Rede Globo e parece estar se dedicando a alavancar nosso cinema. Poxa, eu só posso dizer obrigado para ele.

  • Novas produções e um futuro decente

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Apesar dos cinemas estarem fazendo parte do shopear – ir ao shopping, fazer compras, conversar, comer e ver um filme – ele está se fortalecendo novamente como uma opção hábil do entretenimento no Brasil e mais filmes seguem a receita da premissa básica e boas atuações, fortalecendo essa posição. Entre as que vão estrear (ou estrearam em algumas cidades) eu destaco duas: Apenas o Fim (Trailer) e Os Normais 2 (Trailer).

O primeiro se destaca por ser uma produção autoral de estudantes da PUC-RJ, jovens como eu e você que fizeram um filme e estão sendo premiados em todas as partes do mundo, com um roteiro simples que conta uma história comum de jovens (novamente, como eu e você) indies (aí não sei você). Já a segunda é uma franquia consagrada que tem um elenco que eu admiro profundamente - pô, sou super-fã do Luiz Fernando Guimarães e as sitcoms dos Normais arrancaram muitas risadas no trailer antes de Jean Charles, na sessão que vi semana passada. É legal ver o cinema nacional prestigiado assim.

E por fim, algo que representa um futuro decente é Besouro (Trailer). Uma produção de 10 milhões, com efeitos especiais legais, uma equipe técnica excelentes… Enfim. Se a primeira fase foi a de grandes produções sobre violência e favela, que atraíram investimentos; a segunda fase foi de filmes com roteiros simples e boas atuações para atrair o público; porquê não podemos sonhar com uma terceira fase de filmes de alta qualidade?

That's all, folks!!!

4 comentários:

Porto disse...

O cinema nacional está cada vez melhor porque está andando a passos curtos, sem querer dar salto maior que a perna, atraindo incentivos/investimentos sem recalques ou reducionismos temáticos, onde vários gêneros podem conviver harmonicamente entre si sem conflituar necessariamente um com outro e Selton Mello tem sido a grande referência nisso, não só por causa dos filmes que atua, mas como uma identidade cinematográfica em si. Ele é um sucesso tanto para o público como para a crítica.
Os filmes do Glauber Rocha eram sofríveis, o ponto para ele em minha opinião está no campo da "ruptura" com o antigo estilo de se fazer cinema no Brasil, uma nova visão e nada mais. Os filmes em si produzidos por essa criatura não passa das eloqüências malucas da Era Tropicalista “É AUDIOVISUAL É AUDIOVISUAL” repetia seu bordão por aí, rs... No geral suas idéias eram boas, foram sendo bem recicladas por outros diretores ao passar dos anos e tiveram uma influencia positiva para o cinema nacional.
O cinema brasileiro vivia de chanchada, que eu acho ótimo, um humor autêntico e diferencial. Depois descambou para o submundo da pornochanchadas, que também não eram ruins, apenas um escracho que atestava a limitação do cinema brasileiro. Vieram algumas produções mais ousadas que satisfaziam o público e certa parcela da crítica, mas ainda carecia de densidade técnica como as obras adaptadas da literatura: “Dona Flor e Seus Dois Maridos” e “Gabriela, Cravo e Canela”.
Pra mim o cinema nacional mostra sua faceta potencial mesmo é com “Pixote - A Lei do Mais Fraco” de Hector Babenco lá pelos anos 80, estilo que vai de encontro justamente com os problemas que afligem o Brasil sem perder o quê de humor e ternura na medida do possível.
Depois do boicote do Collor ao cinema brasileiro no inicio dos anos 90 , começa a verdadeira disputa pela “identidade" ( a frescura) do cinema nacional de um lado as comédias não exibia o mesmo fôlego de antes e as produções mais rebuscadas possuíam narrativa insossa sem destaque algum. Disso acontecia a instabilidade de aparecer bons filmes isoladamente por demorados períodos, como se destacou "Central do Brasil" . Vale citar também “O que é isso Companheiro?”. Já agora pelos “anos 2000” se vê que o cinema engatinhava para um bom caminho , Jorge Furtado e Guel Arraes merece um grande destaque , sem eles o destino inevitável era a exploração das mazelas brasileiras por viés cruéis ganhando um destaque superestimado ( falo sobre obras como Cidade de Deus e Tropa de Elite, aos quais não desmereço, mas que por um triz não postergou genericamente uma imagem de cinema idealizado brasileiro totalmente capenga e de visão reducionista).
No cinema de hoje a importância da Rede Globo e da Globofilmes para trazer obras agradáveis e mais despretensiosas é nítida e válida, "Auto da Compadecida" (foi uma mini-série global não esqueçamos), "Os Normais" (também um genial sitcom global), “Sexo, Amor e Traição” e os recentes “Se Eu fosse Você”, “Divã” e “A Mulher invisível” todos tem os dedos da Globo Filmes. Já se há um conceito de “Globochanchada” , mas não como termo pejorativo e sim como um fenômeno capaz de mobilizar a ida do público ao cinema. Ainda temos o cinema “nacional globalizado” com o Fernando Meirelles fechando parceria com roteiristas e produtores internacionais ( “Blindness” e “The Constant Gardener” são exemplos).
É um processo ótimo, pois dessa forma trará o público ao cinema de forma natural não mais para obras que exploram a favelização e disputa do trafico, temas que estavam sendo recorrentes tanto para exportar filmes como para deixar o publico tupiniquim afoito com a truculência. Podemos saborear agora vários gêneros, sem ter que desclassificar esse ou aquele.
E eu to doido para ver “Polaróides Urbanas” do Falabella, toda vez que eu vejo o trailler eu gozo. E esse aí “Apenas o fim” parece legalzinho também, acho que é porque toca “ Pois É” como trilha de fundo, rs.

Bráulio Oliveira disse...

Hahahahahaha, É AUDIOVISUAL, É AUDIOVISUAL!!! Sei que pode parecer tosco hoje, mas na época foi revolucionário - é como você assistir Citizen Kane hoje e estranhar sua simplicidade, ou então os filmes de Chaplin ou ainda, em relação ao terror, filmes como The Hill Have Eyes.

Mas, enfim, belo histórico. Dona Flor e seus Dois Maridos (com Sônia Braga, não aquele dragão que fez o remake) foi a maior bilheteria da história nacional, 15 milhões de espectadores.

Eu não citei, mas nos últimos anos outro nome que tem feito bastante por nosso cinema é Lázaro Ramos. Ele parou um pouco, mas suas produções nos anos 00 foram fantásticas - Madame Satã, Meu tio matou um cara, o impressionante O Homem que Copiava e ainda Saneamento Básico.

E também adorei a expressão Globochanchadas! audhasuahduahsuahdua, fantástica! XD Pior que é, e não é um demérito, ela vem fazendo muito por nosso cinema. Mas não podemos depender apenas dela! Ter O Meirelles e o Walter Salles, além do Rodrigo Santoro e da Fernanda Montenegro fazendo sucesso internacional podem nos ajudar a crescer nesse meio; mas ainda acho essencial produções autorais, como Apenas o Fim. Não sei se besouro é da Globo Filmes também, mas, well.

Ahh, eu tenho o link de Polaroides Urbanas para download! Mas também ainda não vi. XD

Bárbara disse...

Se não fosse a Globo o cinema nacional não estaria se desenvolvendo tanto, ela, além de ser importante na qualidade, é também na divulgação.

É verdade que a qualidade dos filmes brasileiros vem crescendo, juntamente com a variedade, mas, infelizmente, ainda ouço muita gente torcer o nariz quando vê falar que algum filme nacional é bom. Duvidam da nossa capacidade.

Thyago disse...

tive uma overdose de selton mello estes dias, vendo jean charles e o "mulher invisível"