sábado, novembro 22, 2008

Análise de Gênero #01 - Blair Mockumentary

Antes de mais nada vou fazer uma pequena introdução sobre o título para quem não entendeu o que pombas queria dizer com isso. Por partes: Mockumentary é quase que um gênero de filmes, um estilo que passou a ser bem utilizado nos últimos anos e representa bem o submundo independente do cinema, ele é uma junção das palavras da língua inglesa "mock" e "documentary", a primeira significa zombado, fingido, falso; e a segunda é documentário, né!

Juntando as duas temos um filme que finge ser um documentário, uma grande produção que se utiliza das singulares características deles para acrescer uma emoção que quer ser transmitida ao público, como uma maior interação com a película, a sensação de que aquilo é real, ou um intensificador do caráter humorístico causado pela falsa ineficácia da produção, utilizada de forma magistral em "Borat" e presente na maioria dos filmes B. Agora o Blair ali na frente remota para um grande filme, que talvez não tenha sido uma grande produção, que popularizou uma aplicação desse estilo que caiu como uma luva para os filmes de terror: A sensação de real. Explico.


Tudo começou às oito horas da noite de 30 de outubro de 1938, quando um certo jovem radialista chamado Orson Welles resolveu elevar o realismo ao máximo ao transmitir a novela de H. G. Wells entitulada Guerra nos Mundos, com um tom de voz sensacionalista e desesperadoramente realista e contando com a inocência da sociedade da época ele criou um caos coletivo nos Stades. É para isso que se propõe o Blair Mockumentary, criar a sensação de que aquilo que você está vendo na tela é real, assustadoramente real! Ou pelo menos bem próximo disso...

Outro filme que elevou isso ao extremo foi Cannibal Holocaust, uma produção italiana do final dos anos 70 que mostrava a viagem de uma equipe de jornalismo para a América do Sul objetivando gravar o cotidiano de nativos locais; mas eles foram comidos vivos. O filme é de tal forma real que até hoje muita gente pensa que é real... O diretor teve que mostrar às autoridades os atores para provar que eles estavam vivos. PORRA! ELE TEVE QUE PROVAR QUE OS ATORES ESTAVAM VIVOS!

Para não me alongar muito mais apenas na introdu
ção vou deixar essa idéia: O Blair Mockumentary é um falso documentário que busca transmitir o máximo de realidade possível, ao ponto de o público achar que é um Snuff Movie! Uma fucking gravação de cenas reais! Ou, talvez não chegando a esse ponto, mas tentando repassar o máximo de interatividade a esse público. Um recurso bastante utilizado para isso ultimamente é...

Filmagem em primeira pessoa

Esse é um método amado por alguns e odiado por muitos, baseia-se na utilização de um dos personagens da trama para a gravação das ações, integralmente, ou parcialmente durante o filme. Um dos primeiros filmes que utilizou-o foi A Bruxa de Blair, que nos minutos finais mostrou a alucinante cena dos jovens quando de sua chegada ao casebre daquela bruxa catarrenta e peluda, ahhhrg, coisa nojenta!

Para se aproximar ao máximo do realismo de documentários ou até mesmo de filmes caseiros, esse estilo dispensa qualquer tipo de soundtrack ou outros efeitos sonoros, utilizando apenas o som natural do ambiente e as vozes dos personagens. Isso é realmente digníssimo! Quem mais consegue ouvir a respiração ofegante de um ator no meio de carros capotando, helicopteros explodindo, bombas nucleares caindo de um lado e do outro? Esse recurso (ou falta de, a que ponto chegamos, hein?) é fantástico, principalmente se você estiver em uma sala de cinema climatizada e com um bom surround! Imagine, é como ter as personagens ao seu lado dizendo "Puta la mierda, fodeu!"

É claro, e esse é um dos argumentos dos que não gostam desse estilo, que em cenas de correria, tensão, a câmera vai saculejar e você não vai entender muito bem o que está acontecendo, vai apenas ver vultos e flashs de ação. Mas a utilização disto, principalmente no terror e suspense, é mágica. Imagine só, você está em um prédio infestado de zumbis por todas partes, está tudo escuro e você conta apenas com uma pequena lanterna... Aí então focaliza naquele canto da parede e tem uma louca dos gatos cheia de sangue correndo na sua direção! É claro que você vai correr para onde o nariz estiver apontando e verá apenas vultos e flashs dela pelo canto do olho. A filmagem em primeira pessoa te coloca dentro da ação! E se você não gostar é uma putinha labiritidica, e tenho dito! 

Mas a maior reclamação mesmo, às vezes, acontece por...

Não saber o que está acontecendo

Nesse estilo de película, só é repassado aos espectadores o que uma pessoa naquela situação teria acesso, em termos de informação. Ou seja, na maior parte do filme você fica boiando e não sabe porque malditas porras aquilo tudo está acontecendo, ou O QUE está acontecendo.

Mas isso é óbvio! Se a proposta do filme é fazer com que você esteja na posição de um dos participantes do evento, então não faria sentido ter um narrador falando tudo o que está acontecendo e porque, ou até mesmo imagens de outras locações distintas àquelas onde ocorrem eventos relevantes para você. Se você está na sua casa, e do outro lado da cidade um ladrão está com sua planta planejando um assalto você não saberia disso; é assim que as coisas funcionam na real, e no Blair Mockumentary. Assistindo um desses, você tem uma completa...

Sensação de realidade

Essa é uma das principais características do Blair Mockumentary e eu já citei ela anteriormente, além de Cannibal Holocaust que gerou uma investigação policial para saber se aquelas mortes não teriam havido realmente, a própria Bruxa de Blair fez uma gigantesca campanha de marketing divulgando que aquelas ações que ocorreram na floresta eram, de fato, filmagens reais! E por algum tempo foi efetiva, muitos de vocês que estão lendo isso agora devem ter ficado com uma pulga atrás na orelha na época sobre se aquilo era um filme ou um fucking documentário real. 

Eu tinha 09 anos em 1999, bem... 

Dêem um desconto, não é? 

... 

Ah, vão se lascar não tenho culpa!

Mas outros filmes abordaram isso bem, Cloverfield de J. J. Abrams, um dos criadores do seriano norte-americano Lost, criou uma febre na internet após seu lançamento com pistas durante todo o filme que acabaram criando um ARG. Que não é sigla para Argentina, vejam aqui o que é.

Mas nada disso faria sentido se esses filmes não fossem compostos por...

Atores desconhecidos

Como pombas um filme passaria a sensação de que aquela confusão toda é real se o protagonista for Tom Cruise e a mocinha Eva Mendes? Fica muito nítido que é apenas um filme, nada mais que um filme, aquilo não é real, não é real...

É justamente isso que esse estilo de filme busca, sabe aqueles filmes de terror que você está morrendo de medo e fala consigo mesmo: "Isso não é real, é apenas um filme, não há motivos para ter medo", então, eles jogam na sua cara: É, SIM, REAL! OLHE DO SEU LADO, TEM UM PSICOPATA!

Tenho medo de como essas coisas podem parar... Daqui a pouco vão colocar alguns figurantes na sala de cinema, aí entra um cara de dois metros e 200 quilos com uma serra elétrica e corta eles no meio. Nossa, vou vender essa idéia e ficar rico!!!

Ah, agora vamos dar uma passada na estrutura de filme desse gênero, vou utilizar os dois maiores expoentes dos últimos dois anos, REC e Cloverfield:

Início monótono

Tomem por exemplo REC e Cloverfield, eles sempre começam com cenas cotidianas de um grupo de pessoas normais, fazendo coisas igualmente normais e entediantes que só seriam interessantes para velhas anti-sociais viciadas em Big Brother. 

Esse momento é importante para transmitir ao público que aquelas pessoas são normais, assim como eu e você, estão em um dia comum de sua vida na metrópole mais perto da sua casa quando ocorre o...

Pré-Clímax

Está tudo muito bom, tudo muito bem até que ocorre aquilo que foge totalmente ao comum e chama a atenção de todos os personangens que estão envolvidos naquele momento. Não é o clímax definitivo pois a ameaça ainda não surgiu, existe apenas uma expectativa de ocorrência de um fato fora do comum. Não é um clímax definitivo porque a ameaça ainda pode ser frustada.

Como por exemplo, e possivelmente isso será um spoiler para quem ainda não viu Cloverfield, todos estavam na festa quando ouviram um estrondo que fugia ao comum, subiram à cobertura do prédio para ver o que seria aquilo. Claro que ninguém imaginava que seria um lagartão de 30 metros, poderia ser a explosão de uma indústria de fogos de artifício, não sei, mas se fosse algo que não atendesse à expectativa criada todos voltariam para a festa e continuariam como se nada tivesse ocorrido enquanto os bombeiros limpam a bagunça, mas, isso não acontece, se não não teríamos um filme! Então temos o...

Clímax

A expectativa criada é superada por MUITO. Todos estão certos de que era algo que não fugiria ao leque de acontecimentos normais que uma grande metrópole normalmente dispõe aos seus habitantes, mas não é.

Esse é o momento em que não há mais volta, a ordem foi desetabelecida e os participantes daquele circo todo vão ter que dar um jeito ou outro de se livrar daquilo.

Ou não.

O que você faria?

Pessoas normais em situações absolutamente desesperadoras. Outro dia estive discutindo com um amigo sobre o grand finale da produção de Stephen King, O Nevoeiro. 

Cuidado com o spoiler a seguir:

Um pai matando seu próprio filho, existe alguma situação em que isso é plausível, possível? Para mim sim, quem acompanhou a longa, ou leu o livro pelo menos, se sentiu na pele daqueles humanos que se tornaram insetos frente a insetos gigantes, por mais paradoxal que seja. Era uma situação completamente angustiante, desesperadora. Não faço psicologia, mas acho que uma morte tranqüila era tudo que todos queriam naquela situação.

Fim de spoiler, tranquilizem-se.

Outro dia fiz um artigo em que citei o que significava [Ficção Científica]. E a frase que dá início a essa conclusão é bem representativa nesse ponto: O que você faria? O que você faria se um lagartão de 30 metros caísse em sua cidade? O que faria se uma infecção de zumbis se espalhasse no prédio lacrado onde você está? Ou se fosse parar no casébre de uma bruxa peluda e catarrenta? 

Eu não sei, mas os filmes (quase) reais dos Blair Mockumentary nos dão uma boa pista.

4 comentários:

Unknown disse...

curti o artigo, bem explicativo

e eu tinha uns 8 anos quando vi a bruxa de blair e fiquei com mais medo do meu primo contando o filme do q do filme em si...

XD

Bárbara disse...

Na verdade eu nunca tive coragem de ver A Bruxa de Blair (medrosa eu?), mas agora fiquei curiosa, tentarei criar coragem.

Aliás, os filmes "Lenda Urbana" se encaixam nesse gênero? São atores desconhecidos e começam de um jeito rotineiro, com pessoas fazendo coisas comuns.

Bráulio Oliveira disse...

Alguns podem até entrar eventualmente, se eles colocarem o espectador na posição de participante, ou seja, se o desenrolar da trama usar o Narrador-Personagem, e não o Narrador-Onipresente.

A gente estuda essas porcariazinhas no colegial. XD

Mas é isso, se não informar a quem vê a película tudo que se passa, mantendo a tensão. Geralmente fazem isso, até para dar aquele clima de "quem é o assassino?".

Porém isso só ocorre se formos abrangentes, e deixarmos de lado a característica de "falso documentário" da obra.

Diria que se "Suspense com Narrado-Personagem" for um grupo e "Blair Mockumentary" um subgrupo inserido nele, "Filmes Lendas Urbanas" estariam contidos no primeiro e não no segundo.

Bárbara disse...

Ah, certo. Acho que entendi. XD